quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Carros e pessoas

Afrodites, hoje quero falar sobre carros e pessoas.

Vamos lá:
Carros são máquinas feitas em série para transportar pessoas e facilitar a vida delas.
Pessoas são seres vivos, complexos, únicos, com alma, corpo, espírito, inteligência e vínculos afetivos, com capacidade de amar, de criar e de produzir uma enorme quantidade de coisas -- inclusive carros.
Carros foram inventados pelas pessoas para servi-las, e portanto, hierarquicamente, têm menos valor que as pessoas, certo? Errado!
Basta ver o que acontece em São Paulo para saber que os carros valem muito mais que as pessoas. Os carros sempre têm preferência sobre os pedestres. Os pedestres que entram no carro, fecham a porta e começam a dirigir transformam-se imediatamente em outra categoria, infinitamente superior e mais poderosa, a dos motoristas, que odeiam, ou na melhor das hipóteses, ignoram o pedestre. Se o pedestre está atravessando uma rua, é bom correr para alcançar bem rápido o outro lado, porque o carro é que manda e o motorista não vai desacelerar só para o pedestre passar em segurança. Se um pedestre atravessa a rua devagar e o motorista tem de esperar ele passar, a reação contra o pedestre é imediata: "Seu folgado!" Sim, pedestre desafiando o poder do motorista no carro só pode ser folgado -- ou doido, porque corre o risco de ser folgado pela última vez na vida.
De vez em quando vou aos EUA e pego um carro para dirigir por lá. Nos primeiros dias, é um vexame atrás do outro. Estou tão acostumada ao sistema selvagem aqui, das terras brazucas, que só dou mancada. A norma, lá -- e é respeitada -- é o motorista dar a preferência ao pedestre. Se o pedestre põe o pé na faixa, o carro tem de parar e esperar até ele alcançar a calçada do outro lado, ainda mais se for no estacionamento de um shopping, por exemplo. Todo mundo obedece. Menos os capiras que, como eu, estão acostumados à selvageria subdesenvolvida de acelerar em cima dos pedestres "folgados".
Olhem, parece pouco, mas é uma enorme inversão de paradigma. Isso confere uma outra dimensão de respeito e tolerância entre as pessoas, humaniza as cidades.



Só mais uma coisa: acho que o/a motorista feroz de SP deve pensar que o filho, a mulher, o marido ou os pais dele eventualmente são ou serão pedestres. E que ele deve torcer para que os seus queridos não tenham de atravessar a rua na frente de um carro dirigido por um motorista selvagem como ele/ela.

beijos,

Alice

7 comentários:

Anônimo disse...

Aqui na Vila procuro educar os motoristas à força, atravessando devagarinho na faixa. Alguns motoristas diminuem a marcha (algumas mulheres), mas a maioria,não. Qualquer dia, ainda morro atropelado. Serei um mártir do trânsito.

bjs
José Luiz

Anônimo disse...

Zé, eu também faço o estilo educativo. Vou até a janela do motorista que está em cima da faixa de pedestres e digo: "Olha a faixa, irmão! Que coisa feia!" Acho que também sou candidata a mártir do trânsito. Alice

Edney Martins disse...

Olha, com o combustível em baixa (ou seria em alta?) é bom investirmos nas tais vias alternativas de locomoção. As bicicletas são as primeiras lembradas, mas quem se aventura a andar nelas sem ciclovias que ofereçam uma segurança? Eu, daqui de minhas novas bandas, estou me acostumando aos deslocamentos em duas rodas, com minhas pernas e usando o metrô para lugares mais distantes, mas, por via das dúvidas, para não me juntar aos inúmeros mártires do trânsito que morrem diariamente, comprarei um daqueles capacetes...pintado de amarelo flúor. rsrsrsrs

Anônimo disse...

Edney, isso mesmo, e compra também uma buzina para a sua magrela, acessório MUITO necessário em bicicleta (para alertar os pedestres) que só os antigos usam. Aqui em SP ainda é difícil essa história de vias alternativas de locomoção, aliás estamos em vias de não locomoção. Bj, Alice

Anônimo disse...

Não sei se podemos criticar o motorista por não respeitar o pedestre, acho que o desrespeito e mútuo. Eu passo por um farol de pedestre em frente a uma escola, os alunos acionam o farol e atravessa só um, os outros ficam batendo papo e depois acionam novamente, os carros param novamente para um jovem passar e por aí vai.
Falar em bicicleta para quem mora na zona norte de São Paulo é brincadeira, pois aqui só tem morro, eu, por exemplo, moro no topo de um. Posso até descer de bicicleta, mas não sei como chegarei lá embaixo, só sei que não subo.
A realidade em São Paulo é que ela cresceu demais e, com isso, o tempo diminuiu. Tudo é muito longe. Quando converso com amigos de outras cidades ou de outro país, eles não se conformam que a média de tempo que demoro da Faculdade até minha casa, são duas horas do mais puro trânsito, para andar nem 12 km,isso quando não chove como hoje, aí já chegou a 4horas. Imagine como fica seu corpo por estar na mesma posição por tanto tempo? e você lá dentro do carro sem poder fazer nada para sair dali, nem fazer algo útil para sua vida. Quando vc tem a mínima oportunidade de avançar com o carro, vc nem olha pros lados, arranca mesmo.
O que falta para nós é tempo e educação (sempre ela). Tempo para viver, para observar a vida, observar o outro. Quando tivermos esse tempo, seremos mais civilizados. bjs, MJ

Anônimo disse...

MJ, é verdade, o pedestre também é mal educado. Mas veja, a relação de poder carro/pedestre é muito desigual. Então o pedestre tem de ter preferência. E todos têm de ter mais educação no trânsito, se não é selvageria mesmo. Bem, isso tudo se o carro não acabar ficando totalmente supérfluo, num trânsito como o de SP, que vai acabar parando de vez... bjs, AG

Jr disse...

Não são mais os mesmos os valores e o respeito partindo do homem para com tudo, não só para com as outras pessoas, talvez nunca tenham existido verdadeiramente valores e respeito, mas tenham apenas funcionado e ainda funcionem somente como fachada para que possamos convencer a nós mesmos que somos uma espécie superior ou diferente das outras espécies. Essa é uma situação simples e mostra o tamanho do desequilíbrio em que uma simples troca de posição causa grande desequilíbrio e onde o sentimento de superioridade elimina qualquer ponta de racionalidade e a ignorância toma conta. O homem é o desequilíbrio do mundo, essa é uma amostra em menor escala do que essa ignorância esta fazendo com algo em uma escala muito maior.